sábado, 28 de agosto de 2010

CIÚME - O VIRUS QUE ATORMENTA

Ilustração - Zeus e Hera - da mitologia grega.

CIÚME - O VIRUS QUE ATORMENTA

As crises de ciúme provocadas pela infidelidade de seu esposo, Zeus, marcaram o comportamento da deusa grega Hera em muitos episódios da mitologia.
A relação amorosa cria laços únicos, talvez os mais intensos que somos capazes de formar. Além do envolvimento sexual, há a união, a cumplicidade e a entrega. Quando a traição vem romper esses laços, a raiva que sentimos é proporcional ao afeto anterior.
O ciúme é um alerta. É um demônio perigoso que solapa nossa segurança e alimenta nossos medos mais profundos e secretos. Ele consegue desarticular o ego adulto e fortalecer os aspectos infantis que contém. Tem enorme capacidade de nos transformar em crianças assustadas, chorando pelos cantos, flagelando-nos destrutivamente, ameaçadas e sem controle. A dor funciona como um alarme, dizendo a você para prestar atenção, tomar cuidado. Por outro lado, a negação do ciúme, embora pareça uma atitude mais moderna, é arriscada e pode até levar à alienação, à ansiedade e às tentativas disfarçadas de vingança.
Os sentimentos gerados pelo ciúme são tão primitivos que muitas vezes nos arrastam a atitudes completamente fora do nosso padrão de comportamento. O problema é como lidar com esse sentimento tão intenso. Em geral quando estamos com ciúme reagimos com gritos, choro, acusações, ou até mesmo com um silêncio ressentido. Nesse contexto, nem apresentamos nossos sentimentos de forma clara, nem criamos um clima propício para discutir o assunto amigavelmente.
O que é interessante observar são as diferentes formas de reação dos dois sexos. A mulher ciumenta busca desesperadamente uma forma de salvar a relação. Já o homem, na mesma situação, fica mais enraivecido, mas a maior preocupação é proteger sua auto-estima.
Com a entrada em cena de uma rival, algumas mulheres se enconlhem, enquanto outras ficam tão tomadas pela disputa, que "vencer" se torna a questão principal. Essas reações estão ligadas à infância e são explicadas pela psicanálise como fantasias relacionadas ao complexo de Electra, (aquela idade entre 4 e 7 anos que as meninas competem com a mãe na conquista do pai). Com a chegada da idade adulta, qualquer rival que ameace o equilíbrio de uma relação amorosa reavida esses sentimentos reprimidos.
Perder o amor é o medo maior. Às vezes basta imaginar que a pessoa amada está interessada por alguém para que nossos dias se encham de sofrimento. E tanto mais sofremos quando mais somos desconfiados, vendo ameaças onde não existem. Às vezes, a sexualidade desenfreada que atribuímos a nosso parceiro é apenas aquela que nós mesmos gostariamos de estar vivendo.
O sofrimento causado pelo ciúme sempre vem acompanhado da vergonha e da culpa por sermos ciumentos. Melhor seria se, em vez de ficarmos horrorizados com nossos sentimentos, tentar entendê-los e aceitá-los.
Os ciumentos mais violentos são as pessoas possessivas e inseguras. Para elas o amor sempre se transforma em armadilha, pois estão certas de que, se não controlarem a pessoa amada, ela irá trair ou até sair de sua vida. Por serem dessa forma não conseguiram desenvolver a própria autonomia e com essa atitude tentam fabricar uma identidade para si através da "fusão" com o parceiro, de quem ficam dependentes. Diante da dúvida entram em pânico e com medo de que sua metade possa deixá-lo. Não são raros os casos extremos que levam ao crime.
As diferenças entre o ciúme normal e o patológico se confundem. A verdade é que em sua forma normal pode até ter uma função biológica, pois, de acordo com os antropólogos, se não fosse necessário para a evolução da espécie, esse sentimento já teria desaparecido.
O ciúme sempre conduz à acusação. E isto só faz colocar o outro na defensiva e leva a discussão a um impasse. Se conseguimos admitir honestamente nosso ciúme, e falar de nossas ansiedades e fantasias de abandono, veremos que o sofrimento se transforma ou mesmo desaparece. Cada um dos amantes deve aprender a deixar a superfície e descer às raízes, ao sentimento de desamparo. Assim se protege a relação, dando-lhe possibilidade de crescer.
Geralmente a infidelidade esconde um problema mais profundo da relação. Algumas relações até melhoram depois que uma traição é detectada e discutida. O trauma de uma infidelidade pode levar o casal a reavaliar sua relação e a analisar seus pontos cruciais. Não são raros os casos em que a traição é a forma encontrada por um dos dois para forçar uma confrontação e juntos encontrar o melhor caminho para um verdadeiro amor.
Por mais doloroso que seja, o ciúme é também um acompanhamento inevitável do amor e prova de atenção permanente. Ter ciúme é "querer" e, também, é disposição para lutar pelo amor de nossa vida.

Nicéas Romeo Zanchett

1 comentário:

  1. Concordo com Zanchett:

    "Ter ciúme é "querer" e, também, é disposição para lutar pelo amor de nossa vida."

    Apesar que, por vezes, para algumas pessoas, a "disposição para lutar pelo amor" se converte em disposição em afastar...

    Belíssimo texto, poeta! fizestes bem em destacar...vou copiar...

    ;)

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